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25/09/2011 às 03:00
A 44ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro e as mudanças na política cultural do DF são temas da entrevista da AGÊNCIA BRASÍLIA desta semana, com o secretário de Cultura do DF, Hamilton Pereira
Há uma noção equivocada, não só no DF, mas no Brasil inteiro, de que cultura é somente entretenimento, espetáculo. Tratar cultura desta forma rasa é abandonar a produção e reprodução de valores
A Secretaria de Cultura do Distrito Federal (Secult) abre nesta segunda-feira (26/9) o 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Nesta edição, o evento passou por mudanças importantes, com o objetivo de recuperar a credibilidade e o interesse dos brasilienses e da classe artística pela mostra.
A reestruturação das políticas culturais está no cerne dessa mudança. Recentemente o Governo do Distrito Federal anunciou a liberação de R$ 3 milhões para a reforma do Cine Brasília. Este ano a Secult anunciou também a liberação de R$ 55,5 milhões para o Fundo de Apoio à Cultura (FAC), com a seleção dos beneficiados por meio de editais.
Essas medidas, que equilibram artistas brasilienses com os de outros estados e ampliam a transparência com os gastos públicos do setor, agradaram os artistas. Para explicar as mudanças no Festival de Cinema e essa nova forma de fazer política cultural no DF, a AGÊNCIA BRASÍLIA entrevista esta semana o secretário de Cultura, Hamilton Pereira.
Críticos anunciam a perda da credibilidade do Festival de Cinema, um evento que faz parte até do calendário turístico de Brasília. O senhor concorda com isso?
O festival, até por estar na 44ª edição, é a primeira referência desta natureza para o país. Com este ponto de vista, não se pode tirar o mérito do evento. Claro, que aconteceram problemas e, acredito, sim, que houve um declínio. Esta não é a opinião só do secretário de cultura, é da sociedade, das pessoas que fazem cinema no Distrito Federal. A meta agora é recuperar a relevância do festival. Veja só o nome do evento: Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Ele é do país inteiro. Daí providenciamos uma curadoria, coisa que até não existia. A primeira medida foi a antecipação da data. O nosso festival era um dos últimos no calendário. Outra coisa boa dessa antecipação: ninguém vai mais ao cinema debaixo de chuva. Também acabamos com o ineditismo da mostra. Ora veja só: o que vinha para cá eram fitas rejeitadas em outros festivais, então esse critério de obra inédita é totalmente insustentável, sem sentido.
E o que mais foi estabelecido para recuperar o festival?
Acabamos com a bitola. Bitola é o seguinte: antes só entravam filmes em 16 mm, 35 mm… minha gente, isso é restritivo, antidemocrático e ainda por cima uma tecnologia muito cara. Com o fim da bitola abrimos espaço para o cinema digital, que é a tecnologia do século 21. Também descentralizamos a mostra. A partir do dia 26, que é a data de abertura, vamos exibir simultaneamente o mesmo filme do Cine Brasília nas cidades de Taguatinga, Ceilândia e Sobradinho (confira os endereços abaixo). Estas foram as cidades que conseguimos para este ano, mas vamos expandir para outros centros nas próximas edições. Com isso se amplia o alcance das políticas públicas de cultura. Outra coisa importantíssima foi a introdução de uma mostra de filmes em celular e outra competitiva de animação. Tudo isso é inovação, é se adequar às novas linguagens. Outro estímulo: aumentamos o valor da premiação de R$ 80 mil para R$ 250 mil, o mesmo valor de grandes festivais, como o de Paulínia, em São Paulo. Acredito que estas iniciativas reposicionarão o Festival de Brasília do Cinema do Brasileiro.
Como foram as inscrições? Houve uma boa receptividade por parte dos inscritos?
Acredito no êxito, que acertamos nas mudanças. Foram mais de 600 filmes inscritos, sendo 90% em tecnologia digital. São 110 longas e 99 animações. De Brasília, foram 64 inscrições o que mostra que temos uma produção importante.
Como está o pólo de cinema de Brasília?
Em ruínas. Encontramos o pólo em uma situação absolutamente lamentável. Neste momento, a preocupação pontual é a recuperação do galpão para que não chova lá dentro. Estamos estudando juntamente com o Ministério da Educação um convênio para fazer do espaço um local de formação permanente de técnicos de som, de iluminação, de qualificação de mão de obra para o cinema. Esperamos poder devolver ao Distrito Federal este espaço que é muito valioso. São duas pontas do audiovisual brasiliense que estão totalmente desconectadas: o pólo e o festival de cinema.
E esta revitalização do pólo de cinema acontecerá no ano vem?
Começamos em 2012. Mas com certeza durará mais anos. Eu espero para 2012 a oferta dos primeiros cursos e que, a partir daí, que aumente a produção de cinema na cidade.
Há algum projeto de reforma do Cine Brasília?
Já finalizamos a primeira parte da reforma que começou em janeiro e terminou em junho, que é a da impermeabilização. Terminado o festival, vamos à segunda e à terceira fase com o cumprimento do projeto original de Oscar Niemeyer que prevê, além da grande sala com 600 lugares, um conjunto de livrarias, cafés e até salas menores. A ideia é termos um complexo audiovisual de arte e cultura administrado pelo poder público. Infelizmente hoje não temos em Brasília um espaço para um cinema mais autoral e sim, só para os blockbusters, as grandes produções de Hollywood.
E há projetos de reforma para outros pontos de cultura, como por exemplo o Clube do Choro e a Concha Acústica?
Quando assumimos a secretaria em janeiro não encontramos nenhum espaço cultural do DF em condições adequadas. Em nossa reestruturação, constituímos uma subsecretaria de patrimônio que tem por objetivo recuperar todos eles. Uma reforma urgente é a do Teatro Nacional Claudio Santoro que tem 55 mil metros quadrados. A obra é complexa e tem valor estimado em R$ 100 milhões. Não podemos simplesmente fechar o teatro para reforma. Isso é loucura, a cidade precisa deste espaço.
Mas se o teatro fechasse, a obra duraria quanto tempo?
Muito mais de um ano. Mas vamos aos poucos. Primeiro a sala Martins Penna, depois a Alberto Nepomuceno, seguida pela Villa Lobos. Precisamos recuperar o teatro também pensando nas visitas que receberemos em 2014, ano da Copa do Mundo no Brasil. E não estou falando somente do Teatro Nacional, mas de todas as edificações tombadas. Em agosto deste ano, o Distrito Federal recebeu R$ 55,5 milhões para a área cultural. Deste valor, R$ 20,5 milhões serão repassados para reformas de espaços culturais e prédios históricos e R$ 35 milhões serão aplicados em pesquisa e realização de produtos e espetáculos.
A Rádio Cultura passou por várias transformações nos últimos anos que geraram bastante polêmica. Agora, mais uma mudança, dessa vez com investimento em jornalismo. Isso é positivo? Como foi recebida esta adaptação?
A primeira coisa que se fez nesta nova gestão foi reequipar a rádio, com a compra de equipamentos com recursos próprios. Tínhamos um alcance extremamente reduzido que só chegava ao Plano Piloto. Multiplicamos o alcance por cinco e chegamos a toda a área do Distrito Federal. Agora vamos trabalhar para recuperar a vocação da rádio: a agenda cultural. Isto é o que a identifica com os ouvintes. E, a meu ver, a rádio tem que atender ao perfil e à diversidade do que é produzido no Distrito Federal e também acolher o que vem de fora. E por sermos a capital da República, acredito que também temos que contemplar as demais culturas do mundo. Eu não concebo a rádio cultura como uma rádio chapa branca, que só apresenta o lado governamental. Claro que haverá debates sobre o assunto. Mas a partir destes novos equipamentos que chegaram nesta primeira fase, vamos recuperar a relevância deste veículo de comunicação. A Rádio Cultura não pode ser a rádio exclusivamente do rock, do samba, do sertanejo ou só familiar, com dicas e receitas etc. É preciso que ela seja e reflita um conjunto das políticas públicas de cultura do DF, que é abrigar toda a diversidade que existe aqui.
Por falar em diversidade, o ministério da Cultura, por exemplo, expandiu outras faces da cultura, como moda e design. A secretaria de Cultura seguirá o mesmo caminho?
Há uma noção equivocada, não só no DF, mas no Brasil inteiro, de que cultura é somente entretenimento, espetáculo. O certo é que o entretenimento é um momento necessário de qualquer política pública de cultura. Tratar cultura desta forma rasa é abandonar a produção e reprodução de valores. Nossa proposta é de recuperar a sintonia com o ministério da Cultura. Até o fim do ano vamos fazer o ato de adesão do Distrito Federal ao Sistema Nacional de Cultura. Há debates no país inteiro sobre o assunto com um documento que propõe um sistema nacional de Cultura, para que as políticas não sejam somente de governo, mas de Estado. Então temas como moda e design não são só bem vindos, são necessários.
O GDF está praticado uma nova forma de política cultural a partir da seleção de artistas por meio de edital. Como isto foi recebido?
Para o aniversário de Brasília, fizemos uma chamada pública por edital, porque constatamos que os artistas da cidade não participavam dos eventos na cidade. Foram selecionados 155 grupos culturais, cerca de 1,5 mil artistas daqui. Isso não quer dizer que somos contra o que é de fora, mas Brasília precisa ter espaço para mostrar o que produz. A iniciativa foi muito bem recebida e mostrou que estamos no caminho certo.
* Confira as cidades e os endereços onde serão apresentados os filmes do Festival de Cinema de Brasília:
Sobradinho:
Teatro de Sobradinho: Quadra 12, Área Especial 4. Telefones: 3901-6798 e 3901-4106
Ceilândia:
Teatro Newton Rossi, Centro de Atividades Sesc Ceilândia QNN 27, Lote B, Ceilândia Norte. Telefone: 3379-9586
Taguatinga:
Cinemark Taguatinga Shopping, Rua 210, QS 1, Lote 40, Taguatinga Shopping. Telefone: 3352-4708