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02/10/2011 às 03:00
Em entrevista à AGÊNCIA BRASÍLIA, o secretário de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Lúcio Taveira Valadão, avalia sua pasta e prega a valorização da agricultura familiar
Dalila Góes, da Agência Brasília
“Hoje, também queremos inserir a agricultura familiar do DF em outros segmentos de governo, como os restaurantes comunitários e, quem sabe, no futuro, nos particulares. Com renda, temos uma área rural preservada e de qualidade”
Dar mais oportunidades aos agricultores familiares, restaurar os postos de trabalho e mudar o olhar das pessoas e do poder público para o campo são algumas das metas do secretário de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Lúcio Taveira Valadão. Em entrevista à AGÊNCIA BRASÍLIA, ele avalia os oito primeiros meses de sua gestão como um ordenamento, uma arrumação mais do que pontual para cumprir a meta de triplicar a produção de pequenos agricultores nos próximos quatro anos atraindo mais investimentos federais.
Engenheiro agrônomo graduado pela Universidade de Brasília (UnB) e mestre em Irrigação e Drenagem pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), defende a área rural como uma extensão da qualidade de vida das grandes cidades.
Tendo como empresas vinculadas as Centrais de Abastecimento do Distrito Federal (Ceasa) e a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), Lúcio Taveira Valadão destaca as principais linhas de trabalho de sua secretaria: geração de renda e fortalecimento das organizações sociais no campo; desenvolvimento das cadeias produtivas do setor agropecuário; promoção e desenvolvimento do abastecimento e da segurança alimentar e nutricional; desenvolvimento da gestão ambiental, agrária, e da sustentabilidade; regularização fundiária, além de ampliação e manutenção da infraestrutura do setor agropecuário.
Como está a secretaria?
Viemos de um diagnóstico de vários setores: da parte administrativa à operacional. A Secretaria de Agricultura é uma estrutura antiga e tem até um papel histórico dentro do Distrito Federal, porque foi o órgão que permitiu a ocupação agrícola do território. Muita gente não sabe, mas 70% de nossa área é rural, e o Estado teve um papel muito importante na ocupação, com programas de fomento que permitiram que hoje o DF tenha uma das mais modernas agriculturas do Brasil. Não é maior, evidentemente, mas é uma agricultura que tem muitas excelências.
Nesta fase de diagnóstico, o que precisou ser reparado?
Uma das grandes deficiências era a parte de mecanização. Tínhamos máquinas precárias, sem funcionamento e sem capacidade de atender as demandas por conta de anos e anos sem manutenção. Recentemente fizemos um leilão do que não nos servia e, felizmente, estamos limpando o pátio. Agora o processo é de recuperação de máquinas antigas e compra de novas. São motoniveladoras, trator de esteira, pá carregadeira e tratores de pneus que são alugados aos agricultores para uso tanto dentro da área rural quanto na parte de infraestrutura, a conservação de estradas, por exemplo. Outro serviço que foi reativado é o Fundo de Desenvolvimento Rural, com R$ 8 milhões para financiar despesas de investimento e custeio na área rural. Para a captação do recurso, o agricultor deve procurar um escritório da Emater-DF para que sejam elaboradas oportunidades de trabalho, emprego, renda, desenvolvimento tecnológico e ambiental.
E a política de regularização fundiária? No começo do governo, havia cerca de 3 mil agricultores sem respostas quanto à regularização de suas terras. Como está a situação?
Hoje na secretaria temos cerca de 1,5 mil pedidos de regularização. Os processos estão em avaliação e assim que completados serão encaminhados para a elaboração de contratos. A regularização de terras públicas rurais no DF tem o amparo da Lei Federal 12.024/2009, e todo o processo é feito juntamente com a Terracap. Na primeira etapa, vêm os contratos de concessão de uso. Depois, a opção de compra. Para regularizar, o ocupante faz inicialmente um requerimento à Secretaria de Agricultura e é necessário cumprir uma série de exigências, sendo que as duas principais são: estar na área, pelo menos, desde agosto de 2004 e apresentar um plano de utilização, informando detalhadamente o que se pretende desenvolver no terreno. Mas não é uma coisa que se faz do dia para a noite. Tem que haver muita cautela, porque estamos lidando com o patrimônio público.
O governo liberará novas áreas para agricultores? Ou só quem pedir a regularização será avaliado?
Não há áreas disponíveis. Hoje, o que temos são áreas de assentamento de reforma agrária, mas são poucas e atendem a um público específico.
No mapa, onde está a área rural do DF?
Existe área rural em praticamente todas as regiões administrativas. As principais são Planaltina, Paranoá, São Sebastião, Brazlândia, Ceilândia, Sobradinho e Gama (não estão em ordem de importância). A região leste do DF, onde não há cidades, é onde está a maior concentração de área rural. Em termos de produção, nos destacamos pelas hortaliças e grãos como soja, milho, feijão e trigo, além da avicultura. Para se ter uma ideia, 80% da exportação do Distrito Federal vem da avicultura de corte, do frango. Mandamos a produção para a Venezuela e alguns países do Oriente Médio.
Isso quer dizer que somos autossuficientes?
Em alguns cultivos sim. O mercado é muito dinâmico, e o que nós exportamos é praticamente igual ao importado. Ainda dependemos da produção de leite e carne suína, por exemplo, que vem de outros estados. A dimensão do território também não é muito grande, o que traz limitações naturais.
O solo do Distrito Federal ajuda no cultivo?
Quem veio primeiro enfrentou grandes dificuldades. Não havia tecnologias disponíveis para a ocupação da região. Porém, o solo é favorável à agricultura. A região do Cerrado, que engloba Goiás, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, é muito favorável ao cultivo. A tecnologia permitiu que esse solo fosse melhor aproveitado. Além disso, temos uma rede de assistência técnica providenciada pela Emater que permite orientação aos agricultores. Já o clima, no período do verão, de novembro até maio, é absolutamente favorável. No restante do ano, usa-se a irrigação. A produção de trigo, por exemplo, é irrigada, e uma das melhores para ser usada na panificação.
Além da agropecuária, há outros motivos práticos para a preservação de uma área rural em um território tão pequeno?
Claro, a qualidade de vida do meio urbano. Cito um exemplo: a área rural tem melhores condições de infiltração da água do solo. Na cidade, quando chove a água cai no asfalto e vai embora, é perdida. No campo, ela abastece os mananciais. Assim, estamos falando de abastecimento de água e também de qualidade do ar.
Estudos sobre o crescimento populacional do DF apontam que em 10 anos teremos cerca de 1,2 milhão a mais de pessoas. Hoje são 2,5 milhões, de acordo com o Censo de 2010. O senhor não acredita que esses novos habitantes tomariam a área rural?
Uma colocação muito importante, onde toda essa gente irá morar? Mas hoje os programas habitacionais do governo falam em adensamento, que é o uso do espaço urbano. Não podemos espalhar as pessoas no meio rural, até porque isso acarretaria um aumento no custo da infraestrutura, como rede de esgoto, água e energia, por exemplo. Também temos o PDOT (Plano Diretor de Ordenamento Territorial, que estabelece o que é área rural e o que é área urbana), que determina a preservação do território. Então acredito na preservação do espaço rural. E que também ficaremos aqui apertados nas cidades.
E ainda é visível a fuga do campo para as cidades. Ou é só impressão?
Ainda há sim, e se não há melhoria das condições de vida no campo, os filhos dos agricultores abandonam o meio rural. Para fazer a passagem de uma geração para outra é preciso uma boa remuneração do agricultor, um comércio mais justo.
A agricultura familiar, por exemplo, seria um meio de aumentar esta renda?
Sim, e é um dos principais focos desta secretaria. O Distrito Federal comporta cerca de 10 mil estabelecimentos rurais, sendo que 80% deles têm menos de 20 casas. São 397 milhões de hectares de área rural, quase 70% do território do DF, mas apenas 2 milhões aptos à agricultura familiar. O segmento é responsável por 80% da produção de hortaliças da região. Ao todo são 7 mil empreendedores familiares, sendo 6 mil produtores de hortaliças. O mercado é grande e bom, mas está sujeito às regras de mercado. Quando o produtor planta, ele não sabe por quanto irá vender o produto, porque ele é perecível, de risco. Por isso há uma rede de assistência técnica com o programa de renda no campo, que tem uma parte de crédito para a compra de equipamentos e tecnologia. É uma forma de o pequeno competir em condições de igualdade com os grandes. Também há o acesso aos mercados, e a partir daí temos as compras de governo.
Aí entraria a merenda escolar, por exemplo?
Isso. Existe uma lei federal que determina que 30% da alimentação escolar seja adquirida de agricultores familiares (Lei nº 11.947/2009). Isso acontece por chamada pública e cada regional de ensino pode comprar direto do produtor, aumentando, consequentemente, as oportunidades no meio rural. Além disso, existem as redes de proteção social, como creches e asilos. Hoje, também queremos inserir a agricultura familiar do DF em outros segmentos de governo, como os restaurantes comunitários e, quem sabe, no futuro, nos particulares. Não podemos esquecer que existem as feiras como as da 104 e da 314 Norte. Na quinta-feira, por exemplo, em frente a Emater, há uma grande feira de produtos orgânicos. Já na Ceasa, são às quintas e aos sábados. Queremos ampliar os pontos de venda para possibilitar renda. Com renda, temos uma área rural preservada e de qualidade.