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26/12/2016 às 08:51, atualizado em 26/12/2016 às 15:20
Com 19 unidades em 13 regiões administrativas, programa do governo de Brasília visa oferecer apoio psicossocial e prevenir ocorrências. Maior demanda é de crianças, mulheres e idosos
Muitas histórias são compartilhadas todos os dias na pequena sala ao final do corredor D do ambulatório do Hospital Regional do Paranoá. Nas paredes, cartazes sugerem o que não deve ser aceito nas relações. “Amar não é: ferir, julgar, xingar, controlar, menosprezar”, dizem as letras cursivas de criança. Desenhos, colagens e brinquedos lúdicos também indicam que os pequenos passaram por ali. O que os levou até o local é motivo de atenção.
Quando um caso suspeito de violência é identificado, é obrigação do profissional de saúde preencher uma ficha de notificação, conforme determinam o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto do Idoso e a Lei nº 10.778, de 2003, que trata dos casos de violência contra mulheres atendidas em serviços de saúde públicos e privados. Notificar é uma forma de garantir o controle e a visibilidade das situações de violência, além de traçar um perfil de vítimas e de agressores e apontar estratégias eficazes de prevenção.
Além do atendimento individual e em grupos, os núcleos acolhem as famílias direita
De 2010 a 2016, foram notificados mais de 15 mil casos de violência nas unidades do PAV em todo o DF. Em 2016, o balanço parcial chegou a 3.259; em 2015, os registros somaram 1.850. Segundo levantamento deste ano, as violências mais notificadas foram a sexual (481), a física (370), a psicológica (295) e a negligência e o abandono (237). As vítimas mais comuns são crianças e adolescentes de até 19 anos, mulheres e idosos.
Além do atendimento individual e em grupos, os núcleos acolhem as famílias. A necessidade de manter saudável o ciclo afetivo em que a vítima está inserida é expressa nos números. Em 2016, 50,8% dos casos ocorreram nas residências das próprias pessoas violadas; em 2015, 46,9%.
Para 79% das vítimas de até 11 anos, a violência veio de alguém próximo. Nos adolescentes de 12 a 19 anos, essa situação representa 50% dos casos.
O trabalho nas unidades do PAV consiste em três eixos: acolhimento, atendimento e vigilância, como detalha a chefe do Núcleo de Prevenção e Assistência a Situações de Violência da Região Leste de Saúde, Raquel van Boggelen. “Nossa missão é reconhecer, denunciar, vigiar e acompanhar.” Ela coordena os trabalhos do espaço Girassol, voltado para moradores do Paranoá e do Itapoã, e do Tulipa, que atende São Sebastião.
Há casos que entram no programa pela emergência do hospital, mas a maioria é encaminhada pela Justiça, por conselhos tutelares ou pela rede de saúde e de assistência social. “Estamos de portas abertas para o público”, garante Raquel. Após a acolhida, é traçado um plano terapêutico específico e definido o atendimento.
Há dois grupos criados pela equipe do Paranoá para atender adolescentes do sexo feminino. Um deles é o de empoderamento de meninas, voltado para jovens que sofreram qualquer tipo de violência.
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Nesse, o problema é abordado por meio de técnicas e recursos lúdicos. “Trabalhamos temas como gênero, machismo, racismo e feminismo para que depois elas se tornem multiplicadoras em suas comunidades”, explica a psicóloga do PAV Girassol, Ana Carolina Boquadi.
O outro é dedicado a meninas que já sofreram abuso sexual e às mães delas. Esse é uma parceria com a professora Marlene Marra, do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília.
Negligência, abandono e violências física, moral e financeira são algumas das violações mais sofridas pelos idosos, de acordo com levantamento da Secretaria de Saúde. No Girassol, o trabalho voltado para as vítimas dessa faixa etária é coordenado pela enfermeira Tereza de Fátima Bastos, funcionária do hospital do Paranoá desde 2007.
Em 2016, o programa atendeu 13 idosos. No ano passado, apenas um chegou aos cuidados da enfermeira. “Há subnotificação dos casos”, avalia. O desafio nesse caso é sensibilizar a família para ajudar a pessoa idosa.
Para estreitar os vínculos, a unidade criou, em outubro, o grupo de apoio para cuidadores. “Eles têm muito a dizer, são solitários e precisam de suporte e orientação para lidar com a responsabilidade”, avalia Tereza. Nas sessões, há dinâmicas de grupo e troca de experiências, acompanhadas por psicólogo. “É um ciclo de cuidado que deve ser fortalecido; cuidar do cuidador é cuidar do idoso.” A ideia, segundo a enfermeira, é expandir para São Sebastião, onde a demanda é mais alta.
As primeiras unidades a fazer esse tipo de atendimento no DF foram as dos Hospitais Regionais de Taguatinga, de Ceilândia e da Asa Norte e as duas que funcionam no Hospital Materno-Infantil de Brasília (Hmib), na Asa Sul.
A expansão da rede ocorreu em 2011, um ano antes de o Programa de Pesquisa, Assistência e Vigilância à Violência ser criado pela Portaria nº 141, de 17 de julho de 2012. A média de atendimentos em cada uma das 19 unidades é de 2,5 mil a 3 mil por ano. Todas funcionam de segunda a sexta-feira.
Cada núcleo tem uma peculiaridade. “Os que ficam nos hospitais e centros da rede são os chamados de prevenção secundária, em que tomamos medidas urgentes, como afastar o agressor”, explica Fernanda Figueiredo, chefe do Núcleo de Estudos e Programas na Atenção e Vigilância em Violência, da Secretaria de Saúde, e responsável pela gestão dos PAVs.
No total são 15 PAVs de prevenção secundária da violência e quatro unidades de referência, que atendem a demandas específicas. O Alecrim, no Hospital Regional da Asa Norte (Hran), recebe adultos autores de violência sexual. No Centro de Orientação Médico-Psicopedagógica, também na Asa Norte, os serviços do Jasmim são focados nos adolescentes autores de violência sexual. O Caliandra, no Adolescentro (615 Sul), é voltado apenas para vítimas de violência sexual.
No Hmib, há uma unidade específica para atender demandas de interrupção gestacional prevista em lei — casos de estupro —, além de uma de prevenção secundária, a Violeta.
Em janeiro, será inaugurado o Jardim, que já funciona no Adolescentro de forma experimental. Ele terá a característica de encaminhamento de casos para áreas diversas. “Vamos verificar as demandas, se são médicas, psicológicas ou sociais, e direcionar o tratamento dentro da rede”, adianta a chefe dos PAVs. A equipe do Jardim será maior — incluirá o serviço de médico psiquiatra — e servirá como apoio para as demais.
Edição: Marina Mercante