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25/04/2023 às 20:22, atualizado em 25/04/2023 às 20:56
Profissionais do Brasil e do exterior trataram da importância da construção de redes de assistência para aperfeiçoar o tratamento de pacientes diagnosticados com doenças graves
No segundo dia do Congresso Internacional da Criança com Condições Complexas de Saúde — organizado pelo Hospital da Criança de Brasília José Alencar (HCB) em parceria com o Hospital Sant Joan de Déu, de Barcelona —, nesta terça-feira (25), em Brasília, profissionais do Brasil e do exterior debateram a importância da construção de redes de assistência entre hospitais para aperfeiçoar o cuidado a pacientes diagnosticados com doenças graves.
O diretor-geral do Hospital Sant Joan de Déu, Manuel Del Castillo, falou sobre um projeto desenvolvido pela instituição chamado Únicas, que tem como proposta oferecer um cuidado integral a crianças com doenças raras.
Segundo ele, atualmente 50% dos pacientes não têm um diagnóstico preciso sobre a sua condição e 25% deles demoram mais de quatro anos para saber qual tipo de enfermidade estão enfrentando. Um dos principais objetivos do hospital espanhol é alterar esse cenário e fazer com que o diagnóstico seja conhecido em no máximo um ano.
De acordo com Castillo, o Hospital Sant Joan de Déu criou uma rede de apoio com outros 24 hospitais da Espanha para compartilhar informações relacionadas ao acolhimento e tratamento de crianças e adolescentes com condições complexas. Ele afirmou que o intuito é “entregar um diagnóstico mais preciso às famílias e possibilitar tratamentos mais efetivos”.
O diretor-geral frisou que o projeto desenvolvido pelo Hospital Sant Joan de Déu quer aprimorar aspectos relacionados à assistência aos pacientes, ao conhecimento sobre as enfermidades e à realidade social das famílias. Segundo Castillo, “a meta é alcançar uma rede de referência única a nível europeu, sobretudo com igualdade de acesso a terapias avançadas”.
O secretário-geral da Organização Europeia de Hospitais da Criança (ECHO, na sigla em inglês), Ruben Diaz, falou sobre o trabalho desempenhado pela instituição para identificar abordagens sustentáveis para o cuidado de crianças com doenças crônicas e raras complexas.
A entidade reúne 14 hospitais pediátricos da Europa. Segundo Diaz, a ECHO foca em quatro áreas-chave: cuidado ao paciente para melhorar os resultados; profissionais que cuidam de crianças, adolescentes e famílias; processos de prestação de cuidados terciários complexos; e políticas que afetam a saúde infantil e os sistemas de saúde infantil.
“No atendimento ao paciente, o objetivo é melhorar a qualidade dos cuidados que crianças, adolescentes e famílias recebem. Para isso, fortalecemos a capacidade dos hospitais infantis de compartilhar dados para aperfeiçoar a geração de conhecimento e, também, para aprimorar as melhores práticas em terapias avançadas.”
Em busca de garantir sobrevivência
Outra experiência internacional de colaboração entre hospitais pediátricos foi apresentada pelo vice-presidente executivo do St. Jude Children’s Research Hospital, Carlos Rodriguez-Galindo. A instituição coordena uma aliança global que tem a participação de cerca de 200 instituições em 70 países cujo objetivo é melhorar o acesso a cuidados de qualidade e aumentar as taxas de sobrevivência de crianças com câncer e outras doenças complexas.
“A toda hora, cerca de 40 crianças morrem por câncer no mundo. O desafio é lidar com essa realidade. Se não fizermos nada, os números vão crescer. Até 2050, mais de 14 milhões de crianças poderão desenvolver câncer”, alertou.
Galindo explicou que a aliança adota uma abordagem multinível para desenvolver iniciativas regionais, nacionais e hospitalares e atua com programas interregionais para garantir o avanço dos cuidados em todo o mundo.
Todos os parceiros dessa rede de assistência integram pesquisa, inovação e educação avançada com programa e capacitação para criar um novo paradigma em oncologia pediátrica. “A aliança global tem como missão melhorar a taxa de sobrevivência por câncer e outras doenças a partir do compartilhamento de dados organizacionais, tecnologia e conhecimento. Nosso foco é o paciente, ele está no centro do que fazemos”, frisou.
“Não podemos viver como ilhas, pensando apenas na nossa realidade cotidiana. Precisamos interagir com os nossos pares, construir dados robustos que permitam fazer avaliações científicas sérias. Hoje, a colaboração é extremamente relevante para que possamos avançar na atenção às crianças com condições raras e complexas”Valdenize Tiziani, presidente do Congresso Internacional da Criança com Condições Complexas de Saúde e superintendente-executiva do Hospital da Criança de Brasíliadireita
No Brasil, um projeto de cooperação entre hospitais pediátricos é coordenado pelo Hospital de Amor Infantojuvenil, em Barretos (SP). O programa é chamado Aliança Amarte e tem como meta aumentar a sobrevida de todas as crianças que lidam com câncer e doenças complexas a partir da padronização de protocolos de tratamento e diagnóstico.
Participam do projeto 25 instituições, entre elas o Hospital da Criança de Brasília. Funcionários de cada um dos hospitais que integram a aliança se reúnem mensalmente para discutir como é possível desenvolver melhorias para o público infantojuvenil.
Segundo o diretor médico do Hospital de Amor Infantojuvenil, Luiz Fernando Lopes, a aliança desenvolve ações que levam inovação do modelo de gestão assistencial, visando a construção de diretrizes e protocolos clínicos baseados na melhor evidência científica disponível, aprimorando a qualidade da assistência e a segurança do paciente.
Além disso, a rede mantém um banco de dados que permite o rastreamento do paciente com indicadores demográficos, de diagnóstico, estadiamento, tratamento e acompanhamento, entre outros, que possam mensurar a qualidade da assistência. Outro foco da aliança é compartilhar tecnologias, processos, serviços e produtos que possam contribuir para a equalização do diagnóstico.
“Acredito que vamos conseguir, em muito pouco tempo, criar e expandir essa rede para que possamos afastar as disparidades que existem no nosso país e alcançar as mesmas oportunidades que outros países com mais recursos conseguem”, opinou Lopes.
“Crianças com condições raras e complexas exigem mais do que um médico bom. Elas exigem uma estrutura boa, com toda a parte de estratégia diagnóstica e terapêutica”Elisa de Carvalho, diretora clínica do HCBesquerda
A importância da ajuda
A presidente do congresso e superintendente-executiva do Hospital da Criança de Brasília, Valdenize Tiziani, destacou que o trabalho em conjunto com a Aliança Amarte é fundamental para salvar a vida de crianças e adolescentes.
“Não podemos viver como ilhas, pensando apenas na nossa realidade cotidiana. Precisamos interagir com os nossos pares, construir dados robustos que permitam fazer avaliações científicas sérias. Hoje, a colaboração é extremamente relevante para que possamos avançar na atenção às crianças com condições raras e complexas.”
A diretora técnica do HCB, Isis Magalhães, acrescentou que o intercâmbio de experiências faz com que o Hospital da Criança de Brasília seja um modelo para a garantia de uma atenção médica especializada ao público infantojuvenil com condições raras.
“O atendimento a cada especificidade é um desafio constante, mas seguimos um gerenciamento com guias terapêuticos. Conseguimos centralizar os acompanhamentos e trabalhar de uma forma que seja possível devolver ao paciente um cuidado adequado e, ao mesmo tempo, progredir em evolução científica”, diz.
“Crianças com condições raras e complexas exigem mais do que um médico bom. Elas exigem uma estrutura boa, com toda a parte de estratégia diagnóstica e terapêutica”, acrescentou a diretora clínica do HCB, Elisa de Carvalho.
Novas tecnologias
Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos e ex-diretora do Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde do Ministério da Saúde, Vania Canuto comentou sobre os desafios da incorporação de tecnologias no tratamento de distúrbios raros e complexos. Segundo ela, todas as ferramentas precisam de evidências científicas e econômicas de que são eficazes para serem disponibilizadas ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Segundo a especialista, o Ministério da Saúde usa um parâmetro conhecido por limiar de custo-efetividade, que serve para compreender o impacto na eficiência de um sistema de saúde gerado pela incorporação de uma tecnologia nova em relação às existentes. Essa ferramenta reflete o valor máximo que impediria que outras tecnologias deixassem de ser ofertadas no SUS pela incorporação de uma nova.
“O valor da tecnologia é dado em termos de custo e de resultado na parte científica clínica. Nós comparamos essa nova ferramenta à tecnologia que já é disponibilizada e buscamos saber o que uma atualização pode aportar de mais benefícios ao paciente, tanto em relação aos custos quanto à eficiência. Fazemos um monitoramento e uma reavaliação das tecnologias para saber se que foi incorporado está chegando ao paciente, se está sendo eficaz e tendo a efetividade que a gente espera.”
Durante o processo de avaliação de novas tecnologias, são realizadas consultas públicas e, segundo Vania, há uma demanda crescente por parte da população para que medicamentos para o tratamento de doenças raras sejam incorporados ao SUS. “Há uma mobilização da sociedade e uma demanda muito forte por essas tecnologias, que podem preencher lacunas terapêuticas e de tratamentos que não existiam. Antes, as crianças morriam nos primeiros anos de vida, mas agora conseguem sobreviver.”
*Com informações do Hospital da Criança de Brasília José Alencar