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23/04/2020 às 10:54, atualizado em 23/04/2020 às 13:54
Conheça a história dos músicos da velha guarda e da nova geração desse ritmo que ajudaram a criar o Clube do Choro na cidade
É desses estilhaços da história e encontros marcantes que ficaram na poeira do tempo que aos poucos surgiu, entre instrumentistas da cidade, a ideia de um local para homenagear o mais brasileiro dos ritmos nascidos no Rio de Janeiro em meados do século 19. Sim, porque o choro está para o Brasil assim como o fado está para Portugal ou a música flamenca para a Espanha. É considerado a nossa mais genuína e autêntica identidade musical.
Assim, logo as festivas e culturais reuniões que aconteciam pela cidade ganharam um caráter mais sério. Em setembro de 1977, seria lavrada, no apartamento da flautista Odette Ernest Dias – uma francesa que caiu de amores pela música brasileira –, na 311 Sul, a ata de criação do Clube do Choro.
No documento, estava registrado que a agremiação se destinava “a promover a interação de músicos profissionais, amadores e pessoas identificadas com o choro e músicas brasileiras afins”, além da “organização de concertos, recitais, biblioteca e discoteca do gênero, com intenção de estimular a formação de grupos e intercâmbio com associações similares dentro e fora do país”.
Participaram desse encontro antológico, entre outros, o percussionista Pernambuco do Pandeiro, o flautista Bide – primo do mestre Pixinguinha – e o bandolinista e médico Arnoldo Velloso da Costa, além de vários jornalistas e entusiastas do gênero, que aclamaram como primeiro presidente da entidade o citarista Avena de Castro, grande amigo de Jacob do Bandolim. Como os apartamentos e residências dos chorões começaram a ficar pequenos para tantos instrumentistas e convidados, a alternativa foi organizar apresentações pagas no Teatro Galpão e no Teatro da Escola Parque.
“Numa dessas apresentações no Teatro da Escola Parque, o governador Elmo Serejo compareceu e amoleceu o coração ao assistir aos chorões, que faziam uma homenagem ao Pixinguinha”, recorda hoje Henrique Lima Santos Filho, o Reco do Bandolim. “Foi quando ele cedeu o vestiário do Centro de Convenções para apresentações do grupo.”
Foram seis anos de intensas atividades e interatividade fervilhante entre a velha guarda de chorões e jovens artistas que passaram a conhecer aquele gênero centenário que fazia sucesso na mais moderna das cidades do país. Numa época em que as guitarras ditavam moda no cenário musical na cidade, foi fundamental a fusão criada entre o rock e outros ritmos bem brasileiros pelo revolucionário grupo Os Novos Baianos. “O Pepeu Gomes foi o cara que colocou guitarra no samba”, analisa Reco do Bandolim, na época conhecido como Jimi Reco. “A turma dos Novos Baianos apresentou para as novas gerações gente como Assis Valente, Ary Barroso e Dorival Caymmi”.
Movimento e queda
Após um começo promissor, o Clube do Choro mergulharia em franca decadência durante quase uma década, sendo alvo de vandalismo, roubos frequentes e falta de estrutura – o que afastou tanto os músicos quanto o público. “O governo ia retomar a sede, caso algo não fosse feito”, conta Reco, que assumiu a presidência do clube em 1993, arregaçando as mangas no processo de revitalização do espaço.
“Nos quatro anos em que ficou à frente da instituição, o músico trabalhou para adequar o clube às exigências legais e estruturais e receber apoio cultural”, conta Fátima Bueno no livro Do Peixe Vivo à Geração Coca-Cola, sobre a história da música em Brasília. “Além da reforma do espaço para apresentações, ele estabeleceu agenda de eventos e superou divergências entre os defensores da roda tradicional e os partidários da abertura para a incorporação de música popular brasileira afinada com o choro.”
Patrimônio Imaterial
Elevado à condição de Patrimônio Imaterial de Brasília em 2007, o Clube do Choro, hoje, é uma referência nacional e internacional. Seu complexo cultural, projetado por Oscar Niemeyer em 2006, abriga ainda o clube, uma escola de música – inaugurada em 1998 – e um centro de referência e memória do choro.
Sem qualquer “filiação ideológica ou partidária”, como gosta de frisar Reco, o espaço é um dos projetos de música instrumental brasileira mais longevo e bem-sucedido da história da MPB, com mais de 2,5 mil shows apreciados por um público superior a 750 mil pessoas. Uma experiência de sucesso que tem despertado interesse de outros entusiastas da música e do choro em vários países.
“Já viajamos o mundo inteiro dando palestras sobre o Clube do Choro, contando a história do gênero por meio do repertório de vários artistas”, orgulha-se Reco do Bandolim. “É um ponto de encontro democrático da cidade que prima pela qualidade da música apresentada e excelência dos músicos brasileiros, hoje, por meio da nossa escola, exportando seus talentos para todos os lados.”