19/02/2021 às 10:57, atualizado em 19/02/2021 às 11:41

‘O sentimento comum é que sempre se pode fazer um pouco mais’

Comandante do Centro de Comunicação Social do CBMDF, a tenente-coronel Daniela Ferreira fala sobre as ações da corporação

Por Rafael Secunho, da Agência Brasília I Edição: Chico Neto

Uma carta diversificada de serviços à população. Um órgão admirado e que tem um carinho diferenciado do cidadão. O Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF), além de suas atribuições rotineiras, tem contribuído na linha de frente para combater o coronavírus.

Nos últimos 11 meses, a corporação tem ajudado no acolhimento de infectados de alto risco, promovendo apresentações musicais ao ar livre para aliviar a pressão do distanciamento social e reforçando campanhas de doação de leite materno, cujo resultado já rendeu ao DF um recorde: cerca de 18 mil litros doados a recém-nascidos prematuros e com dificuldades no processo de amamentação.

Os militares seguem ajudando em outras frentes. Além dos atendimentos rotineiros de socorro, o efetivo está escalado para orientar a população na prevenção contra a Covid-19 e outras doenças, como a dengue. Em 2020, eles estiveram em 12 regiões carentes, distribuíram 30 mil máscaras de tecido e ainda reforçaram os cuidados com a chegada das chuvas – período em que aumenta a incidência do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue.

Quem conta um pouco sobre essas ações dos bombeiros militares é a comandante do Centro de Comunicação Social do CBMDF, tenente-coronel Daniela Ferreira. Em entrevista à Agência Brasília, ela detalha o esforço das equipes e fala sobre alguns projetos desenvolvidos pelo órgão, que conta hoje com um efetivo de 5.900 militares. Abaixo, acompanhe os principais trechos da conversa. 

Como o Corpo de Bombeiros está ajudando no enfrentamento à Covid-19?

O projeto CBMDF em Ação Operacional está em destaque. Trata-se de uma equipe que vai até as comunidades mais carentes, em um trabalho preventivo. Fazemos a distribuição de máscaras de proteção e de panfletos educativos sobre a proliferação do vírus. Já estivemos em 12 localidades e distribuímos 30 mil máscaras até o momento. Vila Telebrasília, Comunidade Monjolo em Planaltina, Engenho das Lajes e Fercal são algumas já visitadas. E o nosso cuidado não é só com o coronavírus. O DF tem apresentado números expressivos de pessoas atingidas pela dengue e chikungunya. É um trabalho planejado. Nossa tropa se reúne antes com líderes comunitários, e pedimos auxílio na distribuição dos panfletos, na identificação dos locais com grande fluxo de pessoas. Temos o apoio dos administradores também. A cada visita, levamos um efetivo de mais ou menos 45 militares e até 11 viaturas. Outro ponto importante: contamos com oito viaturas exclusivas para o transporte de pacientes suspeitos de terem contraído o coronavírus para os hospitais. Qualquer um pode solicitar o serviço pelo telefone 193.

“Contamos com oito viaturas exclusivas para o transporte de pacientes suspeitos de terem contraído o coronavírus para os hospitais. Qualquer um pode solicitar o serviço pelo telefone 193”centro

Como é o trabalho de combate à dengue e outras arboviroses (doenças causadas pelos chamados arbovírus, que incluem o vírus da dengue, zika vírus, febre chikungunya e febre amarela)?

Nossas viaturas veiculam, em alto-falantes, mensagens de prevenção contra dengue, zika e chikungunya. São alertas de 30 segundos com dicas para não deixar acumular água em vasilhas, tapar caixas d’água, além de cuidar da limpeza das calhas e das vasilhas dos seus animais. Vamos sempre nos horários de maior fluxo nas cidades, entre as 14h e as 16h. Além disso, temos equipes visitando diariamente as residências em busca de focos do mosquito Aedes aegypti. São visitas de orientação aos moradores e monitoramentos das áreas com drones. Os bombeiros fazem um sobrevoo com o drone identificando piscinas abandonadas e empoçamento dentro de algumas residências. Dessa forma, os agentes vão com precisão para os locais com possíveis focos. É um trabalho coordenado com a Vigilância Ambiental da Secretaria de Saúde. Há uma escala específica para a Operação Dengue, em que temos 35 militares escalados para visitas às residências. Já passamos por todas as 33 regiões administrativas e agora estamos revisitando as cidades.

Neste período de chuvas intensas, o CBMDF tem assumido um papel importante no atendimento à população em situação de risco, seja perante queda de árvores, alagamentos ou acidentes de trânsito. Como a corporação trabalha essa questão da prevenção para esses casos?

Temos uma operação deflagrada anualmente, que é a Período Chuvoso. Ela é planejada com uma antecedência de no mínimo quatro meses. É uma época em que preparamos tudo. Os militares são escalados, e, com equipamentos como as motosserras já disponíveis e viaturas prontas a serem usadas em resgates, fazemos treinamentos de corte de árvores de grande porte. Além de atuarmos nos alagamentos, orientamos a população que mora próximo aos córregos, para evitar incidentes.

Quais os incidentes mais comuns?

O mais comum é a queda de árvores, principalmente no Plano Piloto, onde temos árvores muito antigas; e a questão dos alagamentos em pontos bastante específicos, onde o escoamento da água é mais difícil. Com as constantes quedas de energia, também registramos vítimas presas em elevador e somos chamados a atender. Sem contar as colisões de veículos, em virtude do asfalto molhado e, às vezes, escorregadio. As demandas advindas das fortes chuvas são intensas e se somam às demandas rotineiras de socorro a pessoas em situação de risco de morte, etc.

Há alguns meses, o CBMDF passou a investir no recolhimento de lixo eletrônico e reciclagem. Como se deu esse engajamento?

“Com o início das aulas remotas na rede pública, o Corpo de Bombeiros passou a receber muitas cartas e e-mails de crianças que não possuíam o equipamento para acessar os estudos”direita

Com o início das aulas remotas na rede pública, o Corpo de Bombeiros passou a receber muitas cartas e e-mails de crianças que não possuíam o equipamento para acessar os estudos. O 8º Grupamento de Bombeiro Militar, em Ceilândia, quando ainda era comandado pelo tenente-coronel Eloísio Ferreira, começou então uma campanha de recolhimento de celulares e notebooks em desuso dos próprios militares. O tenente, que é técnico em eletrônica, e outros colegas iniciaram o recondicionamento do material para doar àquelas crianças mais carentes e sem condições de adquirir os equipamentos. Foi um sucesso. A rede de escolas La Salle nos contatou, oferecendo mão de obra para ajudar a recuperar esses equipamentos. Isso aumentou a tal ponto que hoje temos o projeto de coleta de lixo eletrônico. Os equipamentos são reaproveitados e entregues diretamente às regionais de ensino para uso dos alunos nas aulas a distância.

A banda do CBMDF conquistou toda a população do DF. A música, que faz tanto bem em tempos de comemoração, foi usada como acalanto na pandemia. A senhora pode contar um pouco dos resultados das apresentações da banda pelas ruas da cidade quando a ordem era que todos ficassem em casa?

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Tudo começou nos primeiros dias da pandemia, ainda em março de 2020. Um momento de muita desinformação, de dúvidas sobre essa nova doença que acabava de estourar. A tropa ficou muito alarmada, por estar exposta a um vírus que ninguém conhecia e que fazia vítimas por todo o mundo. Tivemos a ideia de criar o [projeto] Música até Você, com a Banda do CBMDF visitando os quartéis, levando música e descontração para o ambiente de trabalho. De uma hora para a outra, surgiu o convite da Associação dos Síndicos de Águas Claras para levar a banda para os condomínios, para que tocasse na área de lazer e os moradores pudessem acompanhar das janelas de seus apartamentos. Em contrapartida, os moradores faziam a doação de alimentos. O resultado foi maravilhoso: mais de 200 apresentações em toda a capital ao longo de 2020 e cerca de 28 toneladas de alimentos arrecadados. Foi tudo encaminhado à Secretaria de Desenvolvimento Social [Sedes] para destinar às entidades cadastradas. O grupo continuou a visitar os quartéis para levar conforto aos militares. A banda se apresentou também, duas vezes, no Hospital de Campanha Mané Garrincha. Eles [os músicos] relataram o quão importante foi não só elevar a paz de espírito da população, mas poder levar o pão à mesa de muitos brasilienses. A temporada de 2021 já foi iniciada. Temos 30 apresentações agendadas para as próximas semanas. Tudo respeitando os protocolos de segurança e distanciamento social.

O CBMDF também ajuda no trabalho de envolvimento das doadoras de leite materno e recolhimento das doações. Durante a pandemia, essas atividades são mais difíceis?

“É na dificuldade que temos de encontrar forças para seguir”direita

É na dificuldade que temos de encontrar forças para seguir. É fato que os bancos de leite tiveram uma grande baixa. As pessoas, com o medo de contaminação pelo coronavírus, deixaram de levar o leite aos postos de coleta. E muitos não queriam o contato pessoal em suas casas. Mas fizemos um “trabalho de formiguinha” e recolhemos 17.976 litros de leite doados pelas mães – o que representa um aumento de 5,7% em relação a 2019. Agora, o Programa Aleitamento Materno bateu recordes, e estamos muito felizes com o resultado.

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E como as mães podem doar o leite?

Elas podem entrar em contato pelo telefone 160, opção 4, agendar um horário e dois servidores passam para buscar na residência. E não é só buscar. No primeiro contato, a doadora recebe todas as orientações sobre a assepsia dos potes, como fazer a higienização correta do seio e como conservar o leite. São equipes treinadas, composta por mulheres, e que também auxiliam a mãe a retirar o leite no local. A militar recolhe os potes e entrega novos recipientes para a coleta. Tudo em segurança!

Como a corporação consegue executar tantas ações, além do trabalho rotineiro?

É um trabalho intenso, que envolve, é claro, a prevenção e o combate a incêndios e o socorro e salvamento. Temos orgulho de contar com uma tropa tão dedicada e que se divide para atender a população. Todos os dias, saímos de casa correndo o risco de não voltar. O que nos motiva é o amor pelo que fazemos; é olhar para o próximo e, muitas vezes, adivinhar o que ele está precisando. Isso é do perfil do bombeiro militar. A entrega é grande. Até o nosso último dia na corporação, fazemos o serviço operacional. Mas o sentimento comum no CBMDF é que sempre se pode fazer um pouco mais. A partir daí, é aí que a cada ano surgem novos projetos, sempre pensando no bem-estar das pessoas.

“Todos os dias, saímos de casa correndo o risco de não voltar. O que nos motiva é o amor pelo que fazemos; é olhar para o próximo e, muitas vezes, adivinhar o que ele está precisando”centro